quarta-feira, julho 26, 2006

Pensamentos ao pôr-do-sol...

O sol estava a desaparecer e a noite caía mansamente.
Ainda se sentia algum calor mas a brisa soprava a ponto de me desalinhar os cabelos.
Em vez de ir para casa e cumprir a rotina diária, desci a colina e fui até à praia. A areia estava morna e clara, sentei-me e olhei para o sol que se punha.
Alguma coisa estava errada neste bucólico quadro de fim de tarde... uma mulher, ainda jovem, sentada sózinha na areia assistindo a um cálido final de dia na praia... o que poderia ter esta cena de tão errado?...
Talvés seja a constante tristeza, as mudanças de humor, o sobrolho carregado, a falta de paciencia para as tarefas do dia-a-dia, a respiração que se acelera quando certos pensamentos afloram a mente.
- Problemas de "coração"?... - perguntou-me um amigo há uns dias atrás ao ver-me mais absorta que o habitual defronte de um café misturando um açúcar que nunca ponho.
- Que tolice!, respondi eu - sabes que não tenho esse tipo de problemas, conheces-me bem, eu nunca me apaixono... nem sequer acredito no amor!...
Porém agora ao pensar na minha resposta pronta, parece-me hoje que foi dada hà um milhão de anos atrás.
Mas sim, é verdade, não acredito no Amor, essa figura mítica sobre a qual tantos teorizam e descrevem de tantas formas. Porque não me dirá mais nada esta figura, passando-me quase ao lado?
O Amor é o sentimento humano que mais se presta a mal entendidos, uma emoção que tantas vezes pode pairar entre o Espaço e o Tempo: estarmos nós cá e ele lá, do outro lado, e ser como uma ténue inspiração, o reconhecimento fraco mas mediúnicamente possível, como se sempre tivessemos a certeza de uma nova teoria da Física, algo que sempre pairou no Eterno.
O Amor pode não ser mais nada além de simples histórias e palavras que se vão desfiando mas profundas nos nossos corações, como um conto infantil que vamos sabendo reconhecer sempre que lembramos as suas personagens.
Muito devagar vamos compreendendo essas personagens de cada uma das histórias, podemos ver-lhes as alegrias e tristezas como um reflexo das nossas, desvendando todos os "devia" e "não devia" que interiormente nos têm governado desde sempre.
Passamos as nossas vidas todas ponderando estas duas premissas e sempre que nos libertamos delas, dá-se uma transformação tal qual uma semente que lança raízes na terra e cresce.
Todos temos o direito de duvidar das nossas tarefas nesta estrada da Vida, de vez em quando abandonamo-las, mas nunca as esquecemos.
Talvés a questão seja os nossos desejos, alimentamo-los, eles crescem dentro de nós; como quando desejamos uma flor, colhemo-la e dentro de uns dias ela murcha e morre, o desejo permanece e queremos outra flor.
Este ardente desejo requer um número infindável de flores porque, esfomeado, não se extingue, não se aquieta. Os desejos não têm limites e tal como o espírito, também eles não têm forma nem fim, surgem um atrás do outros como pensamentos.
Procura-se então equilibrar esta balança satisfazendo outros desejos: o sexo, as compras, os copos com os amigos, ler e escrever até doerem os olhos e os dedos.
Sente-se assim alguma forma de "prosperidade" emocional, aprende-se a lidar com a zona obscura do mistério da solidão.
A felicidade, sempre fugás, sempre efémera, acontecerá então como fruto directo dos nossos actos? Então os porquês, tantos como grãos de areia, cadenciam em cada dúvida: será isto bom para mim? Será esta pessoa melhor que a outra anterior e pior que a seguinte? Serei punida ou serei recompensada? Valerá a pena...
Provavelmente a figura lendária do Amor não me diz nada por receio da rejeição ou por medo de virar uma cópia das ideias de alguém.
Nunca nada disto me preocupou muito e os instantes de silêncio que passo a escrever, abrindo as comportas da alma, funcionam como uma limpeza da acomulação de tóxinas do passar dos dias e dos turbilhões das emoções, como se me suprimisse para auto manutenção.
Tálvés continue a sorrir ao instante mágico do pôr-do-sol que finalmente se completa deixando vir a noite que começa a arrefecer-me a pele.
Há um quase valor instantâneo adquirido, uma micro-felicidade quando mergulho os dedos na areia branca e sinto os grãos viajarem anos-luz ao meu encontro, sinto-me consciente dessa unidade e do seu poder.
Respiro fundo e longamente...
Continuarei provavelmente sem compreender porque as relações amorosas resultam ou não resultam, se servem para alguma coisa e para quê afinal existe a figura atormentada e veloz do Amor, tão frágil mas tão marcante; afinal ele raramente nos dá aquilo que achamos que temos o direito de receber!...
Tento elevar-me acima da minha ignorância e pensar que, como disse Cristian Jacq, " o orgulho é a coragem do viajante que nunca se confessa vencido diante do mistério".
Os obstáculos nunca serão vencidos totalmente se não formos capazes de nos vencer a nós próprios.
... levanto-me, arranjo o cabelo em desalinho, sacudo a areia das calças e dirijo-me a casa.
Estou sózinha e tenho um leve sorriso nos lábios... afinal foi apenas mais um entardecer.


( a citação de Cristian Jacq pode ser encontrada na obra " A viagem iniciática ou os trinta e três graus de sabedoria" na pág 33 da editora Pergaminho; a foto tirei da net num qualquer site que não me recordo agora)

9 comentários:

JPS disse...

O que é que está mal na imagem da rapariga sentada na praia?

Um rapaz ao lado dela tambem em silencio.

Repetiria tudo o que fiz e acarinho o bom que senti.

Mas cada vez mais acredito que para cada ciclo da nossa vida existem pessoas certas para nos acompanhar nele. Se tivermos sorte permanecemos juntos dois ou 3 ciclos. Se não...

O Amor é Eterno. As pessoas é que podem mudar.

JPS disse...

PS: Tive sorte...

Anónimo disse...

gostei.voltarei cá.bjs

Woman disse...

A responsabilidade do amor que sentimos, não é do amado em questão. Simplesmente é nossa responsabilidade. Nós predispomo-nos a amar ou não, independentemente da pessoa.
A atracção e a paixão, essas sim são reflexo do efeito causado em nós por parte da outra pessoa. Se passa a ser amor ou não, isso já diz respeito a nós, à nossa vontade, ao momento em que nos encontramos...
Acredito que a dada altura podemos amar alguém que se tivesse aparecido em nossas vidas num outro momento, esse amor já não se manifestaria. Isto porque simplesmente não estávamos para aí virados.
Esta é somente a minha opinião e só vale como tal.

Gostei de passar e do que vi...

Shaktí disse...

Zuco, não admira que para mim sejas quase um ícon do homem romantico.
Se temos pessoas ao nosso lado por ciclos não consigo deixar de pensar se não andaremos todos a viajar em círculos... e eles interseccionam-se vezes de menos...
Eu já tive sorte também...e também não me arrependo de nada mas certamente faria as coisas de forma algo diferente se me fosse dada essa oportunidade.
Beijos e votos de muitas felicidades, volta sempre é um prazer encontrar-te por instantes.

Shaktí disse...

Woman obrigada pelas tuas palavras e pela vista, retribuirei.
Sem dúvida o amor, como emoção, compete-nos a nós senti-lo ou não.
A atracção e a paixão podem ser avassaladoras às vezes por quem nunca se pensou sentir tais sensações.
No meu caso é apenas um estado de alma, um desligamento generalizado, talvés porque como cantava Freddy Mercury "to much love will kill you"...
Desligar a "ficha" é como colocar um paliativo numa ferida, adormece a dor e nós esquecemo-nos que aquela ferida alguma vez existiu.

Um beijo

Shaktí disse...

Girassol obrigada pela visita e volta sempre... adoro girassóis é uma das minhas flores favoritas.
Um beijo

ÍntimoSedutor disse...

Olá...
Agradeço a visitinha e o recado...
Gostei muito de estar aki, deixo ao sair beijos e bom find.....

Anónimo disse...

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