O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas –
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada –
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço...
Álvaro de Campos
(mais um dos meus favoritos e a homenagem humilde ao grande Fernando Pessoa)
sexta-feira, agosto 18, 2006
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
4 comentários:
É muitas vezes o cansaço que nos arrasta para o fim do poço, mas temos sempre quem nos ajuda a tomar aquela vitamina que nos restabelece outra vez, obrigado pelo poema.
Nuno: nunca conto com vitaminas de carácter externo para me dar alento ou tirar dos fins dos poços.
O poema não é meu pertence ao Universo.
Sim eu sei que o poema não é da tua autoria nem me referia a ti própriamente quando falei nas vitaminas
nuno: jogar com as palavras num tabuleiro de ambíguidades nunca foi o meu forte.
Aí ganham-me aos pontos, nem precisam de me dar nenhum avanço porque nunca chegarei aos calcanhares de jogadores tão exímios.
Enviar um comentário